Outubro de 2008 - Nº 12     ISSN 1982-7733
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Política de cotas continua em debate

Victor Rodrigues e Felype Falcão

22 anos, pós-graduação em Ciências da Comunicação na USP e pós-graduação em Comunicação Organizacional na Faculdade Cásper Líbero

São Paulo - SP

Cinco anos após a aprovação, projeto ainda é alvo de discussões.

A implantação do sistema de reserva de vagas para negros nas universidades do Brasil teve início em 2001 na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Três anos depois, o Projeto de Lei nº 3.627/2004, sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estendeu a idéia às universidades federais de todo o país. Hoje, anos após a aprovação, o sistema segue gerando polêmica e dividindo opiniões sobre o tema, além de ampliar o debate sobre o racismo.

Segundo o Prof. José Jorge de Carvalho, do Departamento de Antropologia da UnB – primeira federal a adotar a política de cotas – um dos principais motivos para existência do projeto se justifica através de uma pesquisa realizada por ele cujos dados apontam para um desequilíbrio alarmante num país em que, de acordo com o IBGE,  45% da população é negra: 97% dos atuais universitários brasileiros são brancos, contra 2% de negros e 1% de amarelos. Ainda de acordo com o instituto, estima-se que em cada 100 negros, 90 morem em periferias e na zona rural. Eles também recebem os menores salários do país.

   

Recentemente o assunto foi um dos temas do seminário de comemoração dos 30 anos do Movimento Negro Unificado (MNU). O coordenador do grupo em São Paulo, Reginaldo Bispo, defendeu a política de cotas afirmando que “até hoje não existe nenhum governo que implantou uma medida satisfatória para os problemas dos negros”.

“A começar pelo dinheiro público mal administrado, em que 70% são investidos nas causas que beneficiam a classe branca média e alta, ou seja, a minoria da população brasileira; e apenas 30% restantes para os menos favorecidos, que compõem a maior camada. Com esse desequilíbrio social, os que têm mais continuam ganhando e os que não têm nada, no máximo, continuarão sobrevivendo. Não há política pública que resolva isso. É preciso de investimento pesado para inverter essa lógica governamental”, comentou Bispo.

De acordo com Henrique Cunha Lima, também militante do Movimento, pesquisador das causas negras e professor da Universidade Federal do Ceará, o país precisa de uma análise estrutural para enxergar melhor o seu povo. Isso se aplica também às universidades onde as cotas se fazem necessárias para mudar a estrutura universitária que, em sua maioria, são dirigidas e compostas por brancos. “Essa reestruturação inclui uma reforma nas bibliotecas que possuem pouco material de cultura africana e autoria negra”, sugere.

Ainda segundo ele, a política de cotas tem obtido resultados concretos. Os cotistas têm médias superiores aos demais alunos e o número de evasão é inferior ao dos que não entraram por cota.

Visões distintas

Como toda medida de impacto, o assunto não é consenso. Para Piero Chiaretti, branco, estudante de Ciências Sociais da USP, a idéia é diferente. “Esta medida não passa de uma solução paliativa do governo, que finge tentar amenizar o problema da discriminação racial, quando o problema na verdade é de desigualdade social e acesso a boa educação. O Brasil não precisa de cotas, mas sim de educação de qualidade para todas as camadas sociais”, afirmou o estudante.

Outros alunos também não estão de acordo com a política pública. “Além de uma forma de preconceito com eles mesmos, pois todos têm capacidades intelectuais iguais, o branco pobre, acaba perdendo com isso”, disse Maíra Ortega, aluna de Letras da USP. Paulo Vasconcelos, branco, estudante de Letras da mesma instituição, afirma que a princípio é contra a medida, pelos mesmos motivos justificados pela colega Maira, mas reconhece ainda não ter uma opinião formada sobre o assunto. Já Thiago Silva, negro, é a favor das cotas, mas acredita que existe outra forma para resolver a situação de inclusão.“Não precisei da cota para entrar no meu curso. Embora eu seja a favor das cotas, porque entendo toda a problemática do negro, tenho minhas objeções a respeito”.

Dívida histórica

Apesar de também não ter utilizado as cotas como meio de acesso à universidade, Sandra Santos, relações públicas que trabalha há três anos no Centro de Memória da Unesp, se diz a favor do sistema por acreditar que o debate seja essencial para a sociedade pensar a questão. “Enquanto não se falar, se maquiar, as pessoas não vão tomar conhecimento dessa questão que precisa ser refletida, precisa ser pensada com propostas. Esse embate no sentido positivo só tem a crescer e a ganhar tanto para quem participa quanto para quem está à margem dessa informação. O debate é necessário, precisamos falar mesmo, precisamos agir. Enquanto não tiver política de cotas, ninguém vai tomar conhecimento”.

Na discussão do problema, ela vai mais à fundo ao afirmar que o país tem uma dívida histórica com a população negra que precisa ser reparada. “Judeus que sofreram com o holocausto foram indenizados anos depois. Mas quando se fala da escravidão, famílias e povos que vieram à força, porque não serem indenizados?

Para o historiador João Vargas, a política de cotas é um direito conquistado por parte do movimento negro, justificado pela trajetória histórica destes povos no país. “Ao longo de séculos em que foram escravizados, criou-se um direito maior a algum tipo de reparação e as cotas são uma forma de fazer isso. Ao se instituí-las, se coloca diretamente o debate sobre a desigualdade”, comenta.

Experiência

Mais de duas décadas de trabalho transitadas entre a embaixada dos EUA no país, uma multinacional farmacêutica e a mais recente experiência como professor de ONG americana SIFE no Brasil possibilitaram ao professor negro Durval Arantes obter uma visão ampla da realidade dos negros no mercado de trabalho e em sala de aula.

Segundo ele, se tivesse havido um planejamento racional e a longo prazo no período pós-escravidão voltado para a inserção mapeada do contingente dos libertos, a partir de 1850, a polêmica em torno do assunto não estaria sendo discutida no presente.

Ampliando a discussão para o mercado de trabalho, Arantes comenta que o preconceito sempre existiu e não deixará de existir nos diversos nichos das relações sociais, mas aposta na dinamicidade do mercado globalizado.

Independente de para qual eixo gire o debate, os verdadeiros resultados do sistema de reserva de vagas para negros nas universidades federais só serão conhecidos em 2014, data marcada para a revisão da lei e a para a publicação de um estudo oficial apresentando os impactos dos negros nas universidades, uma década após a aprovação do projeto homônimo.

  

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