Marcos Tonelli
Pesquisador do Grupo de Oceanografia de Altas Latitudes (GOAL)
Laboratório de Oceanografia Física, Clima e Criosfera- OC2 do IOUSP
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Fotos e ilustração: Marcos Tonelli
O termo “Aquecimento Global” foi apresentado pelo pesquisador Wallace Broecker em 1975 e ocupa, hoje, posição de destaque em todas as discussões sobre preservação ambiental e o futuro do planeta Terra. A Antártica, por sua vez, é “figurinha carimbada” em tais discussões, devido a sua grande importância na manutenção do clima golbal. Não é raro nos depararmos com afirmações do tipo: “a Antártica é o radiador do planeta” ou “o ar-condicionado da Terra é a Antártica”.
Mas como isso acontece?
Precisamos entender como funciona o balanço de energia da Terra.
O Sol é a grande fonte de energia para o planeta. Essa energia é recebida sob a forma de radiação solar, preferencialmente, nas regiões equatoriais e tropicais, enquanto as regiões polares recebem uma quantidade muito menor. Na tentativa de alcançar o equilibrio, o sistema promove a redistribuição dessa energia, transportando calor das regiões mais próximas ao equador para regiões polares. É aí que o oceano e a atmosfera entram em ação.
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A maior parte da energia recebida em baixas latitudes é absorvida pelo oceano; parte é devolvida para a atmosfera e parte fica armazenada. Como oceano e atmosfera são fluidos, apresentam a capacidade de se movimentar e transportar esse calor armazenado. Assim, as águas da porção superficial do oceano, que absorvem a maior parte do calor recebido na superfície da Terra, se movimentam em direção aos polos e ao se aproximarem do Continente Antártico entram em contato com a atmosfera, que por ser mais fria, rouba o calor armazenado pelo oceano.
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Entendemos, portanto, como o oceano transporta o calor dos trópicos para os polos... mas o que impulsiona esse movimento do oceano?
A medida que as águas superficiais perdem calor para a atmosfera ao redor da Antártica, ocorre a formação de gelo na superfície do oceano devido ao forte resfriamento, o que resulta na liberação de sal. O processo é o seguinte: Quando a água do mar congela, o sal não congela junto. Ou seja, o sal é expulso do gelo e fica na água que ainda está líquida. Assim, quanto mais gelo se forma na superfície, mais sal é liberado para a parte líquida abaixo aumentando a salinidade naquela região.
Portanto, a água torna-se cada vez mais fria e salina e, consequentemente, mais densa (a salinidade ajuda a aumentar a densidade). Essa água mais densa afunda e se dirige para as regiões equatoriais nas camadas profundas do oceano.
O resultado dessa interação é o estabelecimento de uma circulação de águas superficiais quentes no sentido equador-pólos e de águas densas no sentido oposto junto ao fundo oceânico, controlada pela temperatura (termo) e pela salinidade (halina). Esse processo é denominado circulação termohalina.
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Essa circulação, que tem dois ramos (um superior quente e um inferior frio), funciona como uma esteira ou uma corrente... enquanto um vai, o outro volta. O de cima absorve calor no equador, transporta para o polo e devolve o calor para a atmosfera lá. O de baixo faz o caminho inverso mantendo a continuidade do sistema.
Assim, o ramo superior seria o mais importante, pois é o que transporta o calor. Mas um não existe sem o outro. Então, ambos são essenciais e indispensáveis para manter essa dinâmica dos oceanos.
E por que a circulação termohalina é tão importante?
Porque é ela quem distribui o calor (do equador para os polos); sem ela, não haveria tal distribuição e o clima seria bem diferente. Provavelmente, o equador seria muito mais quente e talvez inabitável. De forma semelhante, as regiões temperadas seriam muito mais frias. A "faixa" onde haveria vida distribuída seria bem menor. Possivelmente, somente uma faixa próxima aos trópicos.
O aquecimento global poderia alterar o balanço de calor e salinidade, resultando na alteração do sistema de circulação.
Mas como?
Por exemplo, o aquecimento poderia aumentar o derretimento do gelo na Antártica. Com isso, ao invés de formar gelo e liberar o sal, o gelo derretido diluiria a água superficial deixando menos salina... e menos densa. A água menos densa afundaria mais lentamente; a taxa de formação das águas profundas (que formam o ramo inferior da nossa "esteira") diminuiria. E toda a esteira ficaria mais lenta. A esteira mais lenta transporta menos calor, esquentando ainda mais o planeta.
A sequencia dos eventos seria a seguinte:
Temperatura aumenta » formação de gelo diminui » salinidade na Antártica diminui » afundamento de águas densas diminui » velocidade da esteira diminui » transporte de calor diminui » temperatura aumenta ainda mais!!
Assim, entendemos porque a Antártica desempenha o papel fundamental para a existência da circulação termohalina e, consequentemente, para a manutenção do clima no planeta Terra!
Os pesquisadores do Laboratório de Oceanografia Física, Clima e Criosfera (OC2) do IOUSP investigam o Oceano Antártico e suas conexões com o restante do globo. O OC2 faz parte do Grupo de Oceanografia de Altas Latitudes (GOAL) e juntamente com pesquisadores de outras instituições brasileiras analisam dados oceanográficos coletados na Antártica e resultados de modelos numéricos para avaliar as variações no comportamento da dinâmica oceanográfica antártica e suas consequências para o clima.
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