Gonzaguinha e Gonzagão. Dois grandes nomes da música brasileira, unidos pelo mesmo nome, tiveram pontos de divergência. O primeiro de todos, musical. As canções populares do velho Lua eram quase o inverso das harmonias e letras elaboradas do filho. Se Gonzagão era alegre e extrovertido, Gonzaguinha era sofrido e reservado. Mas a principal diferença foi mesmo pessoal. Praticamente abandonado pelo pai, que entregou sua criação a um casal de amigos, Gonzaguinha desenvolveu uma personalidade amarga, e só muitos anos depois os dois se reencontraram como pai e filho, e também como artistas.
Da pequena cidade de Exu, esquecida no alto sertão pernambucano em 1912, ano de nascimento de Luiz Gonzaga, à rodovia no sul do Paraná, em 1991, quando Luiz Gonzaga Júnior morreu num trágico acidente de automóvel, uma história se desmembra em duas outras histórias – Luiz Gonzaga do Nascimento, o pai e Luiz Gonzaga do Nascimento Júnior, o filho. Nos 79 anos que separam as duas datas, a trajetória desses dois personagens que alegraram o sentimento popular brasileiro, ao cantar canções tão distintas, é também o retrato do país. Regina Echeverria conduz o leitor para uma viagem por um país de espantosa transformação em menos de um século, na música, na política, nos costumes, além de traçar os encontros e desencontros entre o pai e o filho, dois grandes representantes da nossa cultura.
Luiz Gonzaga (1912-1989), o Gonzagão, era natural de Exu, pequena vila em pleno sertão de Pernambuco. Filho de Januário, lavrador e sanfoneiro. Engajado no Exército, veio para o Rio de Janeiro em 1939, onde inicialmente entrou no meio musical como músico acompanhante. Chegou mesmo a ser proibido de cantar por um conterrâneo famoso (Fernando Lobo), na rádio onde este era diretor. Isso não impediu que alcançasse o sucesso, ao lado de seus parceiros Humberto Teixeira e Zé Dantas, criando o baião, uma síntese dos ritmos nordestinos.
Asa Branca, Baião de dois, Paraíba e Vozes da seca são apenas alguns títulos das muitas canções que, entre 1945 e 1955, conquistaram primeiro o Brasil, depois o mundo. Gravou 210 discos e 312 composições. O baião, antes da bossa nova, foi o primeiro ritmo brasileiro a ter reconhecimento internacional em grande estilo. Redescoberto pela MPB no final dos anos 60, Gonzagão é reconhecidamente a principal influência na obra de Gilberto Gil, Alceu Valença, Fagner e Elba Ramalho, entre outros. Seu enterro reuniu autoridades políticas e eclesiásticas, e principalmente milhares de nordestinos de todas as classes sociais, para os quais foi um líder e um exemplo.
Luiz Gonzaga Junior (1945-1991), o Gonzaguinha, nasceu no Rio de Janeiro. Filho da cantora Odaléia, precocemente falecida, foi registrado por Luiz Gonzaga como filho legítimo, apesar das dúvidas. Criado no morro de São Carlos, bairro do Estácio, berço do samba, formou-se em Economia e foi um dos criadores, ao lado de Ivan Lins e Aldir Blanc, no Movimento Artístico Universitário (MAU), um baluarte na resistência cultural ao governo militar. Compositor profissional desde os festivais universitários do final da década de 1960, só alcançou o reconhecimento popular quase 10 anos depois, com o grande sucesso romântico Grito de alerta, lançado nas vozes de Maria Bethânia e Agnaldo Timóteo. Morreu prematuramente, aos 46 anos, num desastre automobilístico no interior do Paraná, deixando 20 lps.
Fonte: Ediouro - editora que publicou o livro Gonzaguinha e Gonzagão - uma história brasileira, escrito por Regina Echeverria