O Jornal Jovem encaminhou
as perguntas para Ana
Cristina Olmos. Veja aqui a entrevista completa.
Ana Cristina
Olmos
Psicanalista infantil. Presidente da ONG TVer e membro
do Conselho de Acompanhamento da Programação de Rádio e
TV da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.
1) O que a Sra acha da programação de televisão
dirigida aos jovens?
O jovem, assim como qualquer outro telespectador, fornece
o seu olhar, que forma a "audiência". Esse índice de audiência
é vendido pela emissora para anunciantes e patrocinadores.
Quanto maior esse número, num determinado horário, maior
o valor cobrado pelo tempo do anúncio. Esta noção é básica
para se compreender o porquê da baixa qualidade da programação
televisiva. Trata-se de observar que ela não é dirigida
à adolescência enquanto uma faixa etária em formação, com
necessidades próprias para seu desenvolvimento, mas à adolescência
enquanto mercado consumidor de produtos em potencial.
A grade da programação das emissoras comerciais é montada,
então, segundo critérios comerciais, e não critérios de
desenvolvimento. O jovem é considerado bàsicamente como
público-alvo a ser atingido e formado para o consumo. Nesse
sentido, o grande cliente da TV comercial é o anunciante,
que é quem compra o "produto" dessas empresas: o tempo dos
intervalos entre os programas, ou o "merchandising", ou
seja, a propaganda inserida dentro dos próprios programas.
Vale dizer que a prática do "merchandising" é proibida na
legislação de programação televisiva, para a proteção à
infância e adolescência, em países de democracias consolidadas.
Isto porque não fica claro e transparente para o jovem que
aquela "informação" é na verdade a veiculação de uma peça
publicitária.
2) Como se explica o magnetismo que a televisão
exerce sobre as pessoas?
Se você lê um texto de propaganda, por exemplo, o efeito
de convencimento é um. Se você ouve esse mesmo texto simultâneo
a imagens, música, efeitos áudio-visuais, sua atenção é
outra. Assim é para uma aula com um filminho sobre o tema.
A função "neuropsicológica" ATENÇÃO, pré - requisito para
a função MEMÓRIA, fica mais fácil de ser realizada pelo
cérebro, diante do conjunto de estímulos áudiovisuais.
A TV trabalha com esse eficiente conjunto de estímulos,
que propiciam esse magnetismo, essa adesão emocional, dado
que essa classe de estímulos é processada privilegiando
processos sensoriais e não dedutivos, racionais do cérebro.
3) A televisão pode estimular a violência?
Sim, vai depende de seu uso. O veículo de comunicação TV
pode participar da construção dos caminhos da sociedade,
tanto para a civilização quanto para a barbárie. Para o
primeiro destino, quando imprime valores éticos em seus
conteúdos, estimula o respeito às diferenças, à responsabilidade
social, reconhece o direito de todos ao acesso aos bens
da Civilização. Para o segundo, quando TV estimula o uso
da violência como forma de resolver conflitos, a discriminação,
o preconceito e o abuso sob qualquer forma de dominação
e submetimento.
4) O hábito de ficar muitas horas diante da TV pode
mesmo ser prejudicial?
O sociólogo italiano Giovanni Sartori reflete que a cultura
da imagem empobreceu o pensamento abstrato.De fato, do ponto
de vista neuropsicológico, os estímulos áudiovisuais e a
hiperestimulação sensorial favorecem outras áreas do cérebro
que não as mais envolvidas na capacidade de pensar, de deduzir,
de estabelecer relações e de refletir.
5) Qual o processo que faz com que as pessoas se
sintam tão estimuladas a comprar o que vêem na TV?
A adesão às idéias e conteúdos da TV são predominantemente
de natureza emocional. Por exemplo: os mecanismos psíquicos
de identificação e imitação de modelos veiculados na TV
são a base para a indução ao consumo de um produto pelo
telespectador. O jovem acaba por querer se vestir igual,
usar a mesma grife, copiar estilos. Crianças e jovens estão
mais vulneráveis à propaganda e ao risco de manipulação
de suas atitude e idéias. A peça publicitária é montada
em cima de pesquisas sobre o universo consciente e o inconsciente
de cada grupo de consumidores que é eleito como público-alvo.
O "marketing infantil" conhece cada vez mais os processos
psíquicos envolvidos na relação das crianças com os produtos
e as marcas. Cada vez mais, se investiga como "capturar"
seu desejo para o consumo.
6) Por que é tão difícil equilibrar hábito de leitura
com hábito de TV?
A TV está facilmente ao alcance dos dedos: com um simples
clique, o mundo de imagens e sons é trazido à casa do telespectador
e assistir televisão fica uma atividade quase que automática.
Passiva e sem a exigência de um esforço em contrapartida.
Às vezes, até , com a função de preencher um "buraco" emocional:
vira uma dependência. Na leitura, o sujeito é ativo: ela
dá trabalho e conta com o uso da capacidade de pensar. Em
compensação, o treino de funções cognitivas mais elaboradas
favorece um ganho de percepção e o hábito de criar em cada
contexto novo, soluções próprias e mais eficientes.
|