Junho de 2006- Nº 02    ISSN 1982-7733
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O “segredo” de Brokeback Mountain

Ensaio enviado por Carlos Messias
24 anos, formado em Psicologia, é tradutor e intérprete

São Paulo-capital

Eu não sei qual é o segredo de Brokeback Mountain. Quer dizer, é um filme belíssimo, o melhor de Ang Lee desde Tempestade de Gelo, com atuações maravilhosas de Jake Gyllenhaal e Heath Ledger (dois dos maiores talentos da atualidade), uma fotografia deslumbrante e uma história de amor narrada com extrema sensibilidade. Agora, fora o casal apaixonado do filme ser constituído por homossexuais, não há nada de novo ou surpreendente no filme. Muito menos algo de tão memorável que mereça troçentas indicações ao Oscar. Não só isso, como pela primeira vez na minha vida vi um filme receber as cinco estrelas da crítica na Veja SP. Fellini, Bergman, Almodóvar sempre ficaram com três, no máximo quatro. Mas o faroeste gay merece cinco.

Ou seja, frisando, não há nada de tão excepcional no filme fora uma história de amor entre homossexuais narrada com naturalidade. Foi aí que o tiro saiu pela culatra. Pois enquanto a idéia era ver como uma história de amor entre indivíduos do mesmo sexo pode ser igual a uma história de amor convencional, salvo as intempéries de preconceito e intolerância, foi tido como algo extraordinário, justamente por estarmos em uma sociedade preconceituosa, intolerante e, mais que tudo, hipócrita. Pois eles estão vendo isso com tudo, menos naturalidade.

Johnny e June é outra obra superestimada. Não me levem a mal, existem poucos personagens históricos, principalmente pertencentes a cultura pop, tão interessantes e tão merecedores de uma cinebiografia quanto Johnny Cash. Principalmente interpretado com tamanha fidelidade quanto o foi por Joaquim Phoenix. Mas, infelizmente, não é um filme sobre a personalidade obscura e impenetrável do mestre Cash, muito menos sobre seu vasto legado musical. É um romance com todos os clichês que o gênero tem direito, só que utiliza o mito Johnny Cash como pano de fundo. Ou seja, é um Titanic ambientado no show business.

Crash então nem se fala. É um filme presunçoso de desfecho bonitinho com um miolo embolado que por mais que se esforce não consegue sair da mediocridade. Já o diretor, Paul Haggis, roteirista do superaclamado Menina de Ouro, se tornou um dos mais novos queridinhos da Academia de Cinema.

Então, o que acontece? A Academia é um círculo fechado que só permite a entrada daqueles com a “atitude certa”? Com certeza. Existe algum vínculo planejado entre a cerimônia do Oscar e a projeção mercadológica dos produtos ali divulgados (vínculo este que de alguma forma se estende até a Veja SP)? Sem sombra de dúvida. Pois, como podemos ver pela atual repercussão, um “faroeste gay” se mostrou uma idéia extremamente polêmica, apelativa e, como não poderia deixar de ser, vendável. Tanto que o filme Os Reis de Dogtown, também lançado no ano passado, em que Heath Ledger interpretou um surfista desiludido de uma maneira ainda mais magnificente e emocional do que o cowboy gay de Brokeback Mountain, não recebeu nenhuma indicação. O Jardineiro Fiel, deste ano, passou quase despercebido pelos principais festivais e só recebeu uma indicação ao Oscar de melhor atriz, acredito eu, por falta de concorrentes “elegíveis”.

Às vezes me pergunto se as indicações ao Oscar (ou ao Globo de Ouro, ou ao Screen Actors Guild) estão de alguma forma relacionadas à época em que os filmes são lançados. Pois praticamente todos os filmes concorrentes são lançados próximos à premiação. Com a exceção de Crash, que provavelmente nem os seus produtores botavam fé que aquela porcaria concorreria a alguma coisa e o lançaram na metade do ano passado. Mas agora está voltando aos cinemas...

Outra possibilidade que passou pela minha cabeça é se talvez Hollywood (ou até a sétima arte) não estariam morrendo aos poucos, assim precisando fazer o maior alvoroço por qualquer mediocridade que fosse lançada. Mas qualquer um que se atreve a assistir os filmes que são lançados fora do circuito convencional sabe que isso não é verdade.
E nunca tive tanta certeza disso até assistir o novo filme de Woody Allen, Ponto Final.

Como já seria de se esperar Ponto Final mal foi lembrado no Oscar. Ainda que recebeu uma “honrosa” indicação por roteiro, enquanto é superior aos concorrentes em tantas outras categorias além dessa. Na Veja SP, recebeu apenas três estrelas. E, em meio a enxurrada de filmes “elegíveis”, está passando quase despercebido pelos cinemas.
Mas nada disso importa, pois com seu novo filme Woody Allen colocou um ponto final nessa palhaçada toda e mostrou do que um filme de verdade é feito.

Veja mais...

- A Era do Gelo 2

- O “segredo” de Brokeback Mountain

- E o título Woody Allen vai para...

- Ponto Final

 



 

 

VOCÊ SABIA?

Do livro para o cinema: como funciona a adaptação

A adaptação de um livro para o cinema tem enfrentado muitas críticas e preconceitos, e não é de hoje.

Por ter sua origem muito anterior ao cinema , nós tendemos a conferir à linguagem escrita uum caráter de autoridade e importância superior a do cinema .

A religião também tem responsabilidade nesse preconceito, pois durante um longo período de sua história, pregou contra a exibição de imagens. Queriam que a interpretação da realidade ficasse restrita à religião e aos livros. As imagens, muitas vezes, estavam associadas ao pecado.

O que precisamos ficar atentos é que a adaptação não é 'menor' do que o livro. Trata-se apenas de uma diferente linguagem que inclusive não deve ser uma reprodução fiel do livro.

O objetivo do cinema não é 'contar' o livro, não é a leitura dele. O que se pretende com as adaptações é contar uma história apropriando-se de sua essência.

Renata Azevedo Figueira,
19 anos, 2° semestre Cinema Faap/SP

 
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