Julho de 2007 - Nº 06    ISSN 1982-7733
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Uma crônica caipira


Thiago Sogayar Bechara (texto e fotos)

Quando venta lá fora, venta cá dentro da gente também? Às vezes. Que é quando dá aquela tristeza de ser só. Também, só, se é em toda parte. Na fazenda, e em toda imensidão lá da cidade. Hoje levantei mais cedo; fui

ver o sol nascer. Amanhã, vejo ele se pôr. Nunca na vida eu pus reparo em como é lindo assim. Que paz, no meio da pedreira e da serra do Mato Grosso.

Olho da estrada. As palmeiras. Aquelas matas, aquelas pedras, montanhas. Tudo. Tão lindo. Eu que não me dei de olhar, mas estão todos aí. E eu percebi como é ser feliz com o que a gente tem.

Quando desço no rio, deito nas pedras. Fica-se ouvindo o som da água, por cima da areia, numa sombra de peroba. E arre, que venta. Chega que assobia.

 

E dá de às vezes ver no céu, trançar a revoada da passarada. A velha trilha, poeirenta, que eu cruzei até aqui. Fico matutando. Sabe que eu ando mesmo é falando comigo. Sei não se to é louca. Fixo meus olhos no bando na

intenção de segui-lo, como se esquecendo do limite próprio de qualquer lugar. Quando dou por mim, se perderam detrás da capoeira que servia de divisa para o mundo. E nem arame não tem. Ali tudo se acaba. Meu olhar.

Acho, agora pensando, que esses dias foi a primeira vez que eu estive só.

Sentimento de existência. Foi simples como isso. E tão bonito também. Nunca vi tamanha boniteza. Foi como se de nada servisse tudo o que eu vivi até aquele momento, para poder ter essa prova. Deu-me o som das águas, esse mimo.

O de lembrar da minha condição de integrante àquilo tudo. Molhei as costas no orvalho da grama. Descobri o mundo, ó Pai. E aquela solidão, junto do canto de alguma ave – acho que um quero-quero – fizeram aqui um querer-querer

qualquer coisa daquilo para dentro de mim. As formigas, o gado, o cheiro do barranco. As raízes de cada pé de capim que eu amassava com meu corpo.

Nada ali possuía um senhor, senão a própria força que regia e regulava cada elemento. Tudo íntegro. Na comunhão da paz. E eu me pastando, ruminando toda aquela vida que dançava em roda de mim. Quero ser é tudo, árvore. Ser

só e bela e dar o bem. Lembro de quem desmata. Dor, sem jeito de entender.

Um dia os homens entenderiam. E eu que era feliz. Ninguém sabia. Nem eu. Só os quero-queros.

Mas hoje parece que ando descobrindo. Sei não que vai ser se um dia eu tiver que sair daqui. A gente pega amor nas coisas. Até no que é dos outros.

Mas a casa é minha. A fazenda é sua, mas a casa... Daqui desse degrau na varanda teve sempre essas mesmas coisas. Mudaram, mas são sempre elas.

E quem não muda? Até eu estou gostando de olhar pra elas! E não se muda?

Arre, que sim. E o vento ali. Pegado na cerca, o palmiteiro, e aqueles pés de cravo. Mexerica doce que só cá. Terra branca, piçarra. Do outro tem a porteira e muito ipê-roxo, que andaram pondo por volta do açude. Tem peixe tanto que sobra é água. Conversei comigo mesma outra vez. Fiquei ali sentada na pedra de frente pra grota. Falei mesmo, vai saber quem estava ouvindo?

Marido diz que eu sou doida mesmo. Quem não é? Tava era lá vivendo meu mundo irreal. Até o vento cochicha por meio das grevilhas. Por que eu não posso ventar também? Pomba-do-ar arrulha, quer tenha quem ouça ou não! Quero

mais é falar.

Não fui ao cinema, não andei de elevador, acho que nem atravessar rua eu sei. E? Mas o sol: Aconteceu que subindo pra roça dei com um homem bem cedinho olhando o céu. E não entendi foi coisa nenhuma. Bom dia! E segui.

Mas virei e vi bem a direção que ele olhava. E não era o sol nascendo de detrás do Mato Grosso? Passava sempre correndo pra ir pro talhão de café, mas nesse dia foi que eu descobri coisa nova no meio da mesmice. Nunca

tinha reparado. Agora vejo é sempre. E fico pensando. No meio das ruas de milho, tudo embonecado. Boneca de milho é coisa linda que também ninguém repara.

Outro dia, nisso tudo, me chega outro sujeito. E eu ando que não gostando que me atrapalhem os pensamentos. Êta estorvo! Atrapalhou foi muito, querendo rumo da venda da Vilma. Sabe lá pronde é? Quero um cabresto que só pressas bandas. Segue a vida toda e dobra depois do ponte do Timburí, respondi. Serviu pra eu ver como ando em mim mesma.

Rosilda

04/2007

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